Por que nos livros de romance erótico sempre tem mocinhos babacas?
Ou melhor dizendo
Machistas!
Talvez eu esteja generalizando por falar “TODO” e não MAIORIA, mas nós como leitores sabemos que é praticamente impossível disso acontecer, afinal vivemos numa sociedade machista.
Uns dias atrás no Instagram uma amiga pediu pra indicar romances em que os homens não se enquadrassem nessa linha e eu disse a ela “Pergunta de um milhão de dólares”.
Fui olhar na minha estante e fiquei meio que sem saber o que indicar (tinha um ou outro). E como eu leio muito romance comecei a questionar o porquê que ainda são produzidos tantos livros assim.
Será que é um reflexo da nossa sociedade ou uma receitinha de sucesso que deu certo e que vende?
É essa a discussão que vou levantar no texto de hoje.
Quem me conhece sabe que eu amo romances eróticos, mas não quer dizer que eu deva passar pano nas situações bizarras que acontecem.
Acho que é uma discussão extremamente necessária nos dias de hoje.
Continua lendo esse texto, que tá só começando!
Vamos começar pelo básico, nossas queridas sinopses. Separei o trecho de alguns livros (já li todos) pra gente dá uma analisada.
O amante
…Cada instinto está lhe dizendo para correr, mas Jesse Ward não está disposto a deixá-la escapar. Ele a quer e está determinado a tê-la. Ava sabe que está prestes a entrar em um relacionamento intenso e conturbado, mas o que fazer se ele não a deixa ir?
After
…Tessa logo descobre que Hardin possui um passado cheio de fantasmas e os dois começam um relacionamento intenso e turbulento. Depois dele, ela nunca mais será a mesma.
Devoção
…Sexy e arrogante, um cretino e um estranho, disposto a conseguir tudo o que quer e, desta vez, ele desejava Brooke, não importando o preço a pagar.
Fogo
…É então que Ash conhece Josie, uma mulher que aparenta ser imune aos seus encantos e à sua riqueza. Intrigado, ele dá início a uma perseguição implacável, determinado a não deixar que ela seja a primeira a escapar. Ele jamais poderia imaginar que a primeira mulher a lhe dizer? não? seria também a única a levá-lo aos limites do desejo.
Sério, quando vocês leem esses trechos de sinopses não da um pânico?
Olha as palavras “perseguição”, “conseguir tudo o que quer”, “turbulento”, “conturbado”. Acho que não é sinônimo de um relacionamento saudável né?
Mas quando a gente compra um livro não sabe o que vai encontrar, talvez você nem leia sinopses e sempre tem a esperança de que as coisas vão ser melhores.
E aí vem as histórias…
O amante
– quem é que manda ava?
– do que você esta falando?
– estou falando de como seria mais fácil se você aceitassem quem é que manda
————
– não vou deixar você usar esse vestido – ele geme na minha boca
– você não pode dizer o que eu posso e não posso vestir
– tente me impedir – ele me desafia
– e só um vestido
– em você, não é só um vestido ava, você não vai usá-lo
Eu leio esses trechos e começo a rir de nervoso!
After
– Porra, Tessa! você não para de forçar a barra! Eu disse pra você ficar na porra do quarto, varias vezes, e o que você fez? Ignorou, como sempre. Por que é tão difícil ouvir o que eu digo? ele grita, depois da um soco com força na lateral da comoda, rachando a madeira
– Talvez porque você acha que pode mandar em mim, grito
Se um cara grita comigo e da um soco na cômoda eu daria um belo ADEUS, se isso não é um tipo de violência, eu nem sei o que é (isso foi a coisa mais leve que aconteceu em After).
Porque você é minha
– pode me castigar se quiser, mas não permitirei que faça isso só porque fui correr. Não faz sentido.
Contextualizando melhor esse trecho, ela saiu pra correr e o mano ficou nervosinho porque ela não avisou.
Sério mesmo??Agora a mulher é propriedade do cara e ponto final e pior, ele pune ela com sexo por causa disso.
Isso foi só pra ilustrar como essas tramas são desenvolvidas, e tem muito mais. After ainda é o pior deles pra mim e o que mais me preocupa é a justificativa que dão pra defender o Hardin, que o passado foi sofrido e blá blá blá.
Mano o que ele faz durante o livro é injustificável (fica aqui registrada a minha revolta). E como as pessoas o amam é pior ainda.
Eu acho que os romances eróticos veio pra libertar as mulheres das amarras, libertar pensamentos, pudores e paradigmas, mas também é preciso reinventar essas relações.
O que é causa da minha preocupação é a forma como é colocado pelos autores, idealizando um tipo de romance que não é saudável, em que as mulheres se anulam porque elas NÃO PODEM usar certos tipos de roupa, em que o NÃO VAI está constantemente presente e o NÃO QUERO domina as relações.
Ciúmes exagerados, posse como se fossem meros objetos, toda hora perdoar por uma cagada imperdoável, nada disso faz sentido.
Ao passo que a gente estuda a sociedade, a dominação masculina, o feminismo, o patriarcado o nosso pensamento crítico vai melhorando e a gente aprende a identificar esse tipo de coisa.
Separei um trecho bem legal de Inferior é o Car*lho que ajuda contextualizar um pouco esse assunto:
Sarah Hrdy diz: o ciúme sexual está em toda parte, mesmo em sociedades não patriarcais. Mas ele é assim exagerado nas sociedades patriarcais porque os homens estão defendendo todos esses outros interesses. Desde os primeiros registros da história a virgindade e a fidelidade são universalmente louvadas como virtudes femininas, e aplicadas com rigor.
E é isso que a gente encontra na maioria dos livros eróticos, sempre em torno do ciúme, da moça virginal em que o cara que quer conquistá-la a qualquer custo.
Junto com a fórmula do sucesso vem o reflexo da sociedade reproduzida num livro.
A indagação que nossa história e biologia nos levam a fazer é esta: o impulso biológico que os homens tem de, por ciúme, afastar as mulheres de outros homens, combinado com o fato de serem eles, em média, maiores e terem mais força na parte superior do corpo, implica que as sociedades humanas tenham sempre acabado por ter homens no comando, controlando as mulheres e a sua sexualidade? O patriarcado é uma herança genética de nossa biologia?
Um sociologia política do ato sexual faria ver que, como sempre se dá em uma relação de dominação, as práticas e as representações dos dois sexos não são, de maneira alguma simétricas. Não só porque as moças e os rapazes têm, até mesmo na sociedade euro-americanas de hoje, pontos de vista muito diferentes sobre a relação amorosa, na maior parte das vezes pensada pelos homens com a lógica da conquista, mas também porque o ato sexual em sim é concebido pelos homens como uma forma de dominação, de apropriação, de “posse”.
Esses dois trechos tirei de A dominação masculina, eles são muito fortes e ilustra bem o que to querendo dizer neste texto.
Não é minha intensão nesse texto de falar “VAMOS NOS REBELAR E NUNCA MAIS LER OS ROMANCES ERÓTICOS”, de forma alguma!
Até porque eu nunca faria isso, como eu disse no início é meu gênero preferido. Ele que liberta meus pensamentos, me faz viajar.
Cinquenta tons de cinza me marcou pra sempre, é algo que estou relendo de vez em quando. Se você for ler a resenha de O Amante, pode olhar que eu amei. Se você for ver algumas dicas de livros, tem a presença deles.
Não vou ser hipócrita e to colocando minha cara a tapa aqui.
Mas eu sei que essa não pode ser a realidade, você pode até saber também, mas será que o outro sabe?
Será que ele não ta pensando que isso é o certo?
É esse cuidado que eu te convido a ter. É falar “isso não é legal”.
É preciso ter mais atenção na construção desses personagens.
Muitos autores reafirmam a dominação masculina através dos seus livros ao invés de reescrever a história e contribuir para neutralizá-la.
Mas é super possível fazer histórias incríveis, com muitas cenas de sexo, muito romance, mocinhos que faz a gente se apaixonar sem esse monte de característica que a gente discutiu.
Certeza que tem uma galera produzindo isso.
Na próxima vez que for ler um livro, lembre desse texto.
O livro é a forma mais bonita da gente escapar da nossa realidade, da gente se conhecer, conhecer o outro e a sociedade que a gente vive.
A leitura é a arma mais poderosa que nós temos!
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